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Arjunas celestes e o Grande ciclo das eras - onde mito e cosmos se tocam.

  • Foto do escritor: Mauricio Brasilli
    Mauricio Brasilli
  • 19 de set.
  • 5 min de leitura

Atualizado: 21 de set.

Dharma no campo de Kurukshetra
Dharma no campo de Kurukshetra

"O Grupo Arjuna tem mais um membro: Arjuna 2025 PN7 A descoberta é apresentada em uma nova nota de pesquisa no Research Notes of the American Astronomical Society"


"A descoberta do asteroide 2025 PN7, novo membro do grupo de objetos que orbitam em ressonância com nosso planeta sem vínculo gravitacional."


Nos céus próximos à Terra movem-se viajantes discretos, os asteroides Arjunas. Não são satélites cativos, nem errantes sem rumo. Eles se aproximam, tocam a gravidade da Terra como quem roça uma fronteira invisível, entram em ressonância por um instante de harmonia, e logo partem novamente, retornando às órbitas maiores que os sustentam.


Sua dança é feita de ciclos de aproximação e afastamento, como se seguissem a respiração de uma música cósmica que só os corpos celestes sabem ouvir. Em sua órbita, precisam decidir se devem se entregar ao abraço da Terra ou permanecer livres no espaço. Aproximam-se, recuam e voltam outra vez. Não ficam presos, mas tampouco se afastam para sempre. Como se estivessem, lembrando-nos a cada ciclo, uma fidelidade silenciosa, de uma promessa não dita.


E assim como a órbita dos Arjunas revela ritmos ocultos no espaço, também a humanidade percorre vastos ciclos de tempo. Os sábios hindus falaram desses ciclos como Yugas, as grandes eras em que a presença do dharma cresce e declina, repetindo-se como estações cósmicas.


Arjuna compreende o papel do dharma e a natureza de Krishna
Arjuna compreende o papel do dharma e a natureza de Krishna

Arjuna, no épico, é o arqueiro que se encontra diante da grande batalha de Kurukshetra, o campo onde se decide o destino do mundo. Ele também hesita, olha para seus parentes, seus mestres, seus amigos, e sente que não pode lutar. A guerra o chama, mas o coração recusa. É nesse instante que Krishna, manifestação do próprio Vishnu, se revela e fala, trazendo a luz do Dharma. A história nos mostra que a verdadeira batalha não é apenas contra os inimigos externos, mas contra a própria confusão da alma, que deve alinhar-se com a ordem cósmica.



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Assim também fazem os Arjunas celestes. Eles não são capturados pela gravidade da Terra, mas entram em momentos de harmonia, onde a força de nosso planeta e a atração do Sol encontram equilíbrio. É como se obedecessem a uma lei invisível que não os deixa cair nem fugir. Permanecem numa dança que, aos olhos atentos, se repete em ciclos. Ciclos dentro de ciclos.



E aqui entramos no tempo dos Yugas, os grandes ciclos do universo.

Porque os hindus sempre souberam que o tempo não corre em linha reta, mas gira como uma roda, como uma órbita. O Satya Yuga é a aurora da verdade, um tempo em que a harmonia é plena e a luz do Dharma brilha sem sombras, tal como uma órbita que não vacila, uma estrela que não se perde. Depois vem o Treta Yuga, onde a perfeição começa a se inclinar, como um planeta que se afasta um pouco de sua rota. O Dvapara Yuga traz ainda mais incertezas, como asteroides que cruzam o céu em trajetórias múltiplas, sem repouso. E, por fim, o Kali Yuga, o tempo da escuridão, onde a órbita parece instável, onde as forças se chocam e o equilíbrio é mais frágil.


Em cada Yuga, Vishnu desce em forma de Avatar, trazendo de volta a ressonância quando o equilíbrio se perde, tal como um corpo celeste que retorna a seu compasso após o caos do movimento.

No primeiro tempo, o Satya Yuga, o mundo inteiro estava sustentado pela plenitude. Era a idade da verdade, quando o dharma permanecia intacto em seus quatro pilares. Vishnu se manifestava como Matsya, o peixe que preserva as sementes da vida no meio do dilúvio primordial. E como as primeiras estrelas que nasceram do hidrogênio puro do universo, essa era era luminosa e fértil, guardando no seio da criação as sementes de tudo o que viria.



Yugas, os grandes ciclos do universo.
Yugas, os grandes ciclos do universo.

Depois veio o Treta Yuga, quando a ordem já não estava inteira, mas se apoiava em três partes. O equilíbrio exigia esforço, e Vishnu surgiu como Kurma, a tartaruga que sustenta o monte cósmico durante a agitação do oceano de leite. Nessa imagem, ressoa o mesmo movimento lento da precessão dos céus, o eixo da Terra desenhando um ciclo que mistura épocas e constelações, como o oceano sendo revolvido para que de sua espuma brotasse o néctar da imortalidade.


Então se abriu o Dvapara Yuga, a era da dualidade. O dharma restava em apenas duas partes, e as forças opostas se tornaram mais intensas. Foi nesse tempo que Narasimha irrompeu como o leão divino, rasgando o limite entre ordem e caos, e que Krishna guiou Arjuna no campo de batalha, ensinando-o a agir sem apego. No espelho do cosmos, esse Yuga é como o tempo das supernovas, em que estrelas se despedaçam em catástrofes violentas, mas ao mesmo tempo espalham os elementos que permitem que novos mundos nasçam.


Por fim, chegou o Kali Yuga, a era da escuridão, sustentada por apenas um pilar do dharma. É o tempo do esquecimento, quando a ressonância se perde e o peso da densidade obscurece o brilho das eras anteriores. Aqui se anuncia Kalki, o Avatar cavaleiro que virá ao fim dos tempos, não para destruir, mas para restaurar o ciclo, assim como os grandes cataclismos cósmicos encerram uma etapa apenas para que outra comece. É o apagar das estrelas e, ao mesmo tempo, o prenúncio de um novo alvorecer do universo.


Mas os Yugas também têm guardiões. Cada ciclo é lembrado, corrigido e reorientado pela presença dos avatares de Vishnu. Como os Arjunas celestes que regressam em sua visita, também Vishnu retorna, em formas diversas, para lembrar à humanidade de sua rota. Peixes, tartaruga, leão, príncipe — cada manifestação é como um corpo celeste que se anuncia no firmamento, cada um trazendo o peso do equilíbrio necessário.


Assim, entre os asteroides que dançam na borda da gravidade, o guerreiro que busca equilíbrio no coração da batalha, e os Avatares que descem em eras cíclicas, revela-se um único princípio: tudo se move em ciclos de afastamento e retorno, de crise e renovação, de perda e ressonância. O nome Arjuna, inscrito no céu e no épico, nos lembra que tanto os astros quanto os homens e os deuses obedecem à mesma respiração do tempo.


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E quando olhamos para cima, para esses pequenos corpos celestes que vêm e vão como guerreiros em órbita, ou quando lemos os versos antigos que narram batalhas e revelações, percebemos que mito e cosmos falam juntos. Ambos nos contam que não estamos em linha reta, mas em espirais de eternos retornos, dançando na fronteira entre gravidade e liberdade, entre finitude e eternidade.


E é nesse ponto que mito e cosmos se tocam: o herói que busca o Dharma no campo de Kurukshetra é o mesmo que dança sobre nossas cabeças em forma de asteroides. O tempo dos homens e o tempo das estrelas não são distintos, mas camadas de uma mesma escritura cósmica. E, quando falamos dos Yugas, falamos também dessa escrita, dessa grande órbita onde a humanidade é apenas mais um viajante, tal como os Arjunas, sempre tentando se alinhar à harmonia invisível que sustenta o universo.

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